Chapada Diamantina: área é desmatada com licença irregular e preocupa agricultores familiares em Piatã
Segunda / 30.11.2020
Por Redação Sertão Hoje
O governo da Bahia, por meio do Instituto do Meio Ambiente e Recursos Hídricos (Inema), concedeu licença irregular de desmatamento para um empreendimento de agronegócio no município de Piatã, região da Chapada Diamantina, segundo o Ministério Público da Bahia (MP-BA). Cerca de 900 hectares já foram desmatados, o que equivale a 900 campos de futebol. A promotoria de Justiça do MP-BA informou que solicitou o cancelamento da autorização, mas ainda não há resposta do órgão ambiental.
A denúncia do empreendimento irregular foi feita por moradores e agricultores familiares da Chapada, que chegaram a fazer manifestações contra o desmatamento. De acordo com o grupo, a empresa Hayashi já possui cultivo em outro terreno, nos municípios vizinhos de Mucugê e Cascavel. O medo dos agricultores familiares é que o empreendimento leve a mesma escassez de água e degradação do solo para Piatã.
O promotor de Justiça Augusto César de Matos, responsável pela atuação do MP-BA no caso, explica que o empreendimento está se instalando em uma área vasta na região das planícies, que é um local importante de agricultura familiar, na Chapada Diamantina. "Esse primeiro imóvel conseguiu essa licença, que segundo investigação nossa, do Ministério Público, através da Promotoria Regional Ambiental do Alto Paraguaçu, é ilegal. Ela na verdade é uma chancela. É um ato administrativo que o estado da Bahia concede, através do seu órgão ambiental, o Inema, para que o empreendedor possa retirar, suprimir, cortar, toda a cobertura vegetal, ou seja, retirar toda a proteção natural de floresta, para que ele possa ocupar o solo com agricultura", explica o promotor, complementando ainda que, por essa Autorização para Supressão Vegetal (ASV) ser um ato administrativo, acaba revestida do aspecto de legalidade,mas para que seja válida, de fato, ela precisa cumprir requisitos que estão no Código Florestal Brasileiro.
Segundo Augusto César de Matos, a investigação identificou que a ASV se baseou em informações do Cadastro Estadual Florestal de Imóveis Rurais (Cefir) que é autodeclaratório, ou seja, as informações são passadas pela própria empresa. "Nós percebemos, ao longo da investigação, que ela [autorização] baseou-se em um Cefir irregular. Esse Cefir é um ato autodeclaratório, mas ele é chancelado, é confirmado pelo Inema, que é o órgão ambiental do estado. E, na verdade, quando o Ministério Público se debruçou sobre esse documento, percebeu-se inúmeras ilegalidades", destaca.
O Código Florestal impossibilita o desmatamento de áreas de recarga dos mananciais hídricos da região e com a possibilidade de existência de espécies ameaçadas de extinção, além de definir a necessidade de manutenção de 20% de cobertura vegetal em todas as áreas de reserva, o que é chamado de reserva legal. A legislação prevê que esse percentual tem que estar obrigatoriamente preservado, com mata nativa íntegra. No Cefir apresentado pela empresa, ela descreve um percentual correspondente a 28 hectares de áreas de preservação permanente (APP), de reserva legal, áreas produtivas e as áreas que já foram utilizadas e possíveis de serem utilizadas. No entanto, a extensão total do terreno é muito maior, o que aumenta o percentual de proteção. "Então nós pularíamos aí de 28 hectares a serem preservados para mais de 100 hectares que deveriam estar constando no Cefir, quando não constam. E deveriam estar protegidos, ou seja, essa área jamais deveria ser tocada. Ela deveria ser preservada, sob o aspecto legal e sob o aspecto ecológico", explica o promotor.
O que chama a atenção para a situação é que o Inema, órgão que tem que conferir os dados da autodeclaração do Cefir antes de emitir a autorização, não fez a checagem e apuração do que foi comunicado, o que torna a concessão irregular. "A autorização foi pautada em um Cefir absolutamente irregular, totalmente desconectada com a realidade. Inúmeros estudos, através de imagens de satélite, de georreferenciamento, sensoramento remoto, detectou com precisão a extensão dessas áreas de APP, não computadas no Cefir e ilegalmente abatidas, contrariando o Código Florestal. Portanto, a ASV, desde o início, é fulminada de ilegalidades", explica o promotor.