Sertão Hoje

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Colunistas

Fabiano Cotrim

É professor e advogado do escritório "Cotrim, Cunha & Freire, Advogados Associados", em Caetité. Membro da Academia Caetiteense de Letras (cadeira Luís Cotrim), Mano, como é conhecido, gosta mesmo é de escrever poesias, mas, desde os tempos de Maurício Lima, então batucando na sua velha Olivetti Lettera 32, colabora com o Jornal Tribuna do Sertão, sempre nos mandando crônicas.

Umbu...

Perto do meio-dia voltou para casa. Não esperaria a boia chegar na roça como todo dia. Tinha compromissos depois do almoço. Iria na casa do compadre Bento acertar negócio de gado. Entrou em casa e quem estava lá? Bento, o compadre. E chupando umbu. Uma bacia de umbus fresquinhos, doces, certamente tirados do pé que ficava no terreiro e estava carregado...

Não gostou. Não podia gostar. Bento e Zefinha sozinhos em casa. Melhor, Zefinha sozinha em casa e Bento lá, sentado em sua cadeira, em sua mesa, e chupando umbu?

Não gostou. Ele jamais faria isto, entrar em casa de mulher casada que está só era coisa que não se aceitava por aquelas bandas. Bento não sabia disso? Sabia! Claro que sabia, todo mundo sabe disso!

- Opa compadre!

-Opa.

Disse opa, mas queria dizer outra coisa, melhor, fazer outra coisa. Botar dali para fora o abusado, o desrespeitoso, o que entrava em casa de mulher casada quando o marido estava fora. A mão coçou para pegar no facão que trazia pendurado no cinto. Matar não era o caso. Mas umas panadas nas costas, ah, isso Bento merecia...

- Tava passando por aqui e lembrei do nosso negocim...

- Carecia não, compadre. Sou ciente das minhas obrigações e arriei o serviço mais cedo justamente pra ir ter consigo, lhe pagar o que devo...

A voz já não disfarçava o descontentamento com aquela intromissão disfarçada de visita. Ainda mais para lhe cobrar! Logo ele, que jamais atrasara um pagamento em toda a sua vida. Desaforo...

- O compadre quer acertar logo agora, poupar tempo da ida lá em casa?

- Posso não. O dinheiro tá no banco, tenho que ir na cidade e depois passo em sua casa para lhe pagar, conforme o combinado.

Falou com tanta secura que o Bento entendeu. Levantou-se. Saiu.

Já no terreiro, antes de montar no seu cavalo, virou-se e disse aquelas que seriam as suas últimas palavras.

- Que mal-educado que sou, compadre. Esqueci de agradecer a Dona Zefinha pelos umbus...

- Carece não...

- Carece sim! Nunca vi umbu ser tão doce como o da sua mulher compadre...

- Como é que é? Repete...

- Apois, nunca vi umbu ser tão doce quanto o de Dona Zefinha. Chupei até me acabar...

Morreu ali mesmo, as mãos segurando as rédeas, a cabeça decepada esguichando sangue na copa do umbuzeiro...

 

P.S. – A ideia original dessa crônica quem me deu foi o amigo Edilson Alves de Brito, Bu, o dono da venda mais famosa da cidade e grande contador de estórias, a quem agradeço.