Sertão Hoje

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Colunistas

Fabiano Cotrim

É professor e advogado do escritório "Cotrim, Cunha & Freire, Advogados Associados", em Caetité. Membro da Academia Caetiteense de Letras (cadeira Luís Cotrim), Mano, como é conhecido, gosta mesmo é de escrever poesias, mas, desde os tempos de Maurício Lima, então batucando na sua velha Olivetti Lettera 32, colabora com o Jornal Tribuna do Sertão, sempre nos mandando crônicas.

A hora em que a água tá caindo...

Amigos, amigas, não há mal que sempre dure, nem bem que não se acabe, ou não há bem que sempre dure, nem mal que não se acabe, como preferirem. O que importa é que em Caetité, com o mal do racionamento de água nos enchendo a paciência e ameaçando o nosso futuro, ganhamos um bem, um prazer, uma alegria. Falo da “hora em que a água tá caindo”, que é como se diz por aqui.

Ah, você que é de fora não sabe o quanto é prazeroso esse momento para os caetiteenses sedentos, calorentos, suados. Uma festa toma conta das casas, mães telefonam para filhos, maridos, netos, chamando todos eles para aproveitar a dádiva e tomar um banho decente, lavar roupas, lavar louça, lavar a alma.Como se fôssemos uma bem organizada colmeia, nos pomos todos a postos para receber sua majestade, a água racionada. Um ouve se a pressão é suficiente para que o líquido chegue aos reservatórios, e é esse que dá a notícia tão aguardada:

- “Tá caindo na caixa!” Grita eufórico.

É a senha para que os outros exerçam suas funções. Alguém cuida da pia; outro do tanque; outro ainda rega eventuais plantas, dá um banho no cachorro... bem, isto quando a família é mesmo unida e solidária. Maior parte das vezes é uma das amigas que nos lê que tem de fazer tudo isto sozinha. E rápido, que a tal “hora em que a água tá caindo”é fugaz como o tempo de baile da Cinderela, passa num instante só e aí começa o racionamento propriamente dito. A economia diária e necessária, e incômoda, e assustadora.

Dizem até, e eu não confirmo, apenas repito irresponsavelmente, que há até quem marque encontros amorosos de olho no cronograma distribuído pela EMBASA. Lá, no cronograma, há uma singela gotinha azul nos dias em que é possível viver a mágica da “hora em que a água tá caindo”, e é assim, de acordo com a nefasta folhinha, que muitos regram a sua vida amorosa. É que não dá para ser romântico tomando um banho de meia tigela, dizem. Há que se lavar os cabelos longos das moças namoradeiras. Há que se arrumar segundo os padrões metrossexuais vigentes, para os rapazes conquistadores. E tudo isso exige água em abundância, banhos mais demorados, roupas limpas, água enfim.

Entretanto, habituados que já estamos com as agruras dos dias e dias sem água, hoje vivemos por aqui da maneira mais otimista possível e curtimos o que restou nos alegrando imensamente na “hora em que a água tá caindo”.